Sunday, July 22

Poesia medieval - Abadessa, oí dizer

Comprei hoje um livro de Eugénio de Andrade - Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa - onde o autor faz uma selecção das poesias que mais lhe sobressaem na sua memória de leitor, por ordem cronológica. Eu gosto particularmente da poesia trovadoresca. Aqui têm um exemplar.


Abadessa, oí* dizer
que érades mui sabedor
de todo bem, e, por amor
de Deus, querede-vos doer
de mim, que ogano* casei,
que bem vos juro que nom sei
mais que um asno de foder.

Ca me fazem em sabedor
de vós que avedes bom sem
de foder e de todo bem,
ensinade-me mais, senhor,
como foda, ca o nom sei,
nem padre nem madre nom ei*
que m'ensin, e fiquei pastor*.

E se eu ensinado vou
de vós, senhor, deste mester*
de foder e foder souber
per vós, que me Deus aparou*,
cada que per foder, direi
Pater Noster e enmentarei*
a alma de quem m'ensinou.

E per i* podedes gaar,
mia senhor, o reino de Deus:
per ensinar os pobres seus
mais ca por outro jajuar,
e per ensinar a molher
coitada que a vós veer,
senhor, que nom souber ambrar*

AFONSO EANES DO COTOM (séc. XIII)

oí - ouvi
ogano - este ano
ei - hei (verbo haver, "tenho")
pastor - jovem, inocente
aparou - arranjou
enmentarei - referirei
i- aí

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