Wednesday, November 21

Alberto Caeiro


Foi poeta singular, sensacionista, símbolo da negação do pensar, da razão. Em todos os seus poemas está presente uma tentativa expressa de ver a realidade com "o olhar" e nunca com a razão. Poder-sé-á considerar este heterónimo como o oposto do ortónimo. Contudo, a temática central é a mesma, apenas observada de um prisma diferente. É, acima de tudo, o poeta da natureza, prosaico e simples na sua linguagem, com uma suavidade surpreendente em todo o seu discurso. Confesso admirador de Cesário Verde, foi também ele admirado pelos restantes heterónimos e Fernando Pessoa ortónimo.





Tu, místico, vês uma significação em todas as cousas.

Para ti tudo tem um sentido velado.

Há uma cousa oculta em cada cousa que vês.

O que vês, vê-lo sempre para veres outra cousa.

Para mim, graças a ter olhos só para ver,

Eu vejo ausência de significação em todas as cousas;

Vejo-o e amo-me, porque ser uma cousa é não significar nada.

Ser uma cousa é não ser susceptível de interpretação.



In Poemas Inconjuntos



Quando tornar a vir a primavera

Talvez já não me encontre no mundo.

Gostava agora de poder julgar que a primavera é gente

Para poder supor que ela choraria,

Vendo que perdera o seu único amigo.

Mas a primavera nem sequer é uma coisa:

É uma maneira de dizer.

Nem mesmo as flores tornam, ou as folhas verdes.

Há novas flores, novas folhas verdes.

Há outros dias suaves.

Nada torna, nada se repete, porque tudo é real.



In Poemas Inconjuntos



XXXV


O luar através dos altos ramos,

Dizem os poetas todos que ele é mais

Que o luar através dos altos ramos.


Mas para mim, que não sei o que penso,

O que o luar através dos altos ramos

É, álém de ser

O luar através dos altos ramos,

É não ser mais

Que o luar através dos altos ramos.


In O Guardador de Rebanhos



XIII


Leve, leve, muito leve,

Um vento muito leva passa,

E vai-se, sempre muito leve.

E eu não sei o que penso

Nem procuro sabê-lo.


In O Guardador de Rebanhos

1 comment:

Anonymous said...

Alguém que tem noção que nada vê... é alguém que já vê muito! =)
grande caeiro.